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Em MT, PT nunca será favorito; esquerda não sabe se comunicar

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O professor de Comunicação e pesquisador da Universidade Federal de Mato Grosso, Thiago Cury, fez uma análise do futuro político do PT em Mato Grosso e avaliou que o partido nunca será favorito em disputas eleitorais no Estado.
 

Em Mato Grosso sou obrigado a dizer, e isto já vem de algum tempo e deve continuar ainda por algum tempo, que ele [o PT] nunca será favorito

“Da mesma maneira que se eu fosse um analista político no Nordeste, falaria o contrário, aqui em Mato Grosso sou obrigado a dizer, e isto já vem de algum tempo e deve continuar ainda por algum tempo, que ele [o PT] nunca será favorito em uma eleição seja majoritária, seja proporcional”, afirmou Thiago.   
 
Na última eleição municipal, o partido repetiu seu feito de anos e mais uma vez não conseguiu eleger nenhum prefeito em Mato Grosso. Já em Cuiabá, apesar de ter ido para o segundo turno com o deputado estadual Lúdio Cabral como candidato a prefeito, o PT saiu derrotado no embate com o PL.
 
O mesmo ocorreu em todas as eleições para Governo que o partido lançou candidatura.

 
Cury disse acreditar que o que faltanao PT, assim como outros partidos de esquerda, é uma “comunicação alternativa”. Para ele, o partido peca ao ficar para trás em meio às novas tecnologias que hoje são dominantes.
 
“Há uma dificuldade tanto em relação ao PT como em um campo maior da esquerda, de lidar com essas novas formas de comunicação”, disse.
 
Ao longo da entrevista ao MidiaNews, o professor também falou sobre a junção de fatores que corrobora com a falta de aceitação aos candidatos petistas no Estado.
 
Confira os principais trechos da entrevista:
 
MidiaNews – Recapitulando a eleição passada, o PT conseguiu chegar ao segundo turno da disputa para prefeito em Cuiabá, mas no final foi derrotado. Na Câmara também não conseguiram eleger nenhum vereador. Acredita que esse cenário mostra um PT enfraquecido para o pleito de 2026?
 
Thiago Cury – Eu acredito que sim.  Na realidade, não posso propor uma análise sem considerar o ambiente na qual essa análise está inserida.  Então, da mesma maneira que se eu fosse um analista político no Nordeste, falaria o contrário, aqui em Mato Grosso sou obrigado a dizer, e isto já vem de algum tempo e deve continuar ainda por algum tempo, que ele nunca será favorito em uma eleição seja majoritária, seja proporcional. 
 
A gente não teve a chegada de ninguém do PT, por exemplo, a Câmara aqui na cidade. E a gente já não tem há algum tempo algum candidato do PT sendo, não digo competitivo, porque competitivo Lúdio foi, mas assim, em vias de ser eleito.
 
A gente tem uma cultura estabelecida no Estado e obviamente na cidade, que é mais conservadora e em alguns momentos, de um certo momento da história para cá, no qual inclusive a gente se encontra, que flerta com o reacionarismo.
 
A hegemonia tanto de Jair Bolsonaro como da vitória de Abilio Brunini, provam isso. Mostram que o PT, acho que em nenhum momento na sua história, encontrou tantas dificuldades de vencer uma eleição aqui em Mato Grosso como agora. 
 
MidiaNews – Em Cuiabá, o partido nunca conseguiu eleger um prefeito e no Estado um governador. Na sua opinião, por que o partido não consegue ocupar esses espaços? Por que os eleitores têm tanta resistência aos candidatos petistas?
 
Thiago Cury – É um combinado de vários elementos.  A gente também não pode desconsiderar as culturas, ou a cultura que é vigente em cada localidade.  Aqui em Mato Grosso, a influência econômica e também política do agronegócio é determinante nesse aspecto.
 
É do agronegócio, como um setor da sociedade e economia, ter uma determinada visão de mundo sobre a sua própria realidade. E isto é inevitável. Outros setores têm uma visão mais progressista, enquanto o agro tem uma visão mais conservadora.
 
E por ter uma ascendência grande no Estado e na cidade em relação à população, de alguma maneira a população vai meio que remando a favor da maré que é definida do agronegócio.  Então, o agro tem um alinhamento de direita, em algumas situações até de extrema-direita e no caso a população cuiabana e mato-grossense segue na mesma tônica.
  
MidiaNews – Para o senhor, o que o PT precisa fazer para mudar essa realidade em Mato Grosso? Acha que isso é possível apesar da dominância bolsonarista que a gente vê nos municípios?
 

A melhor chance, talvez até a única, do PT vencer a eleição seja com Lula. Apresentar outra candidatura, é praticamente definitiva no sentido de que haverá uma derrota

Thiago Cury – O que falta ao PT é o que falta de alguma maneira ao campo progressista: ter uma atuação mais efetiva nessa comunicação alternativa. 
 
Isto pressupõe dois movimentos. O primeiro é um movimento proativo na produção de conteúdo e compartilhamento.  Me parece que o campo da direita tem uma atuação mais contundente tanto do ponto de vista da produção como compartilhamento.
 
Quer dizer, há uma dificuldade tanto em relação ao PT como em um campo maior da esquerda, de lidar com essas novas formas de comunicação e também de criar intermediários que possam compartilhar, que possam replicar este conteúdo que é algo que a direita consegue ter de forma mais eficiente e isso acaba gerando resultados eleitorais positivos. 
 
Acho que passa também, de repente, por uma reconstrução da relação do partido com a própria população e isso pressupõe uma relação corpo a corpo. A volta às ruas, a volta às assembleias, às instâncias mais populares de debate, para tentar compreender de que maneira essas pessoas estão pensando, por que elas rejeitam tanto o PT.
 
MidiaNews – Acredita que a falta de uma liderança expressiva do PT em Mato Grosso contribui para essa rejeição?
 
Thiago Cury – Entendo que o problema é ainda maior. O PT, regionalmente ou em ambientes locais, ainda consegue apresentar algumas lideranças.  Mas o problema maior é do ponto de vista nacional, quer dizer, não há hoje ninguém que consiga, que seja capaz de incorporar o capital político do próprio Lula.
 
E entendo que aqui também pode haver um conjunto de explicações para isto, mas é um problema também cuja responsabilidade é do próprio Lula e do próprio partido. O Lula é candidato a presidente pelo PT desde 89, quer dizer, apenas com três eleições, duas delas, a Dilma é candidata, porque ele também não poderia ser candidato por um terceiro mandato e depois com Fernando Haddad, porque ele estava inelegível. Mas ele é o grande representante.
 
Então, uma liderança nata, sem que precise estar vinculada a Lula, nunca existiu. E ainda não existe. De modo que se o Lula não vier a ser candidato em 2026 ou for em 2026 e depois certamente não será em 2030, o PT e o campo da esquerda ainda não estão preparados para esta substituição.
 
Não haverá ainda uma passagem propriamente de bastão. Pode ser que neste intervalo de tempo exista algum movimento, mas atualmente não há. O que é um problema tanto para o partido como para a esquerda.
 
MidiaNews – Em 2026, o PT já deixou claro que quer ter um candidato próprio para disputar o Governo do Estado. Acha que hoje existe algum nome forte que poderá ser competitivo em meio a nomes como Otaviano Pivetta e Wellington Fagundes? Ou deverá repetir o feito de uma candidatura mal planejada como foi em 2022?
 
Thiago Cury – As eleições para o Governo do Estado são muito importantes tanto para deputados, senadores e também presidente. Ciente de que a batalha política eleitoral em Mato Grosso para o PT é praticamente perdida.
 
Você falou de duas candidaturas que estão mais alinhadas ao espectro da direita, precisa ver quem vai querer abraçar o Jair Bolsonaro para abraçar também um possível extremismo, porque duas candidaturas de direita, no mesmo espectro, não podem existir.
 
Então, precisa ver como essas duas peças que você citou, e de repente até mais alguma outra, vão se organizar para disputar os votos, porque aí fica também muito candidato para pouco voto. 
 
Diante desse cenário, de praticamente uma eleição perdida para o PT e para a esquerda, entendo que o PT vai preferir, não da forma como fez em 2022, porque foi algo muito mal planejado e acabou sendo desastrado, tentar apoiar alguma candidatura que também possa viabilizar o PT em outras eleições.
 
MidiaNews – O Lúdio ganhou uma projeção nacional devido ao embate com o prefeito Abilio Brunini em Cuiabá. Não acha que o partido perde ao não tentar emplacá-lo em uma cadeira na Câmara Federal?
 

Nagro tem um alinhamento de direita, em algumas situações até de extrema-direita e no caso a população cuiabana e mato-grossense segue na mesma tônica

Thiago Cury – Sim. Na verdade, acho que o PT, sendo um partido importante como é, deveria lançar candidaturas para todos os cargos.
 
Agora, pensando como o partido, diante do diagnosticando, acho que o partido vai decidir não indicar candidaturas.  A minha visão é que devesse fazer. 
 
Ao mesmo tempo, por que o PT vai abrir mão do Lúdio na Assembleia Legislativa, que tem quase como certa a reeleição, para indicá-lo à Câmara dos Deputados? Mesmo podendo ter uma votação expressiva, ele pode não ser eleito por causa do coeficiente eleitoral.
 
Tudo isso o partido acaba levando em conta para atuar de forma pragmática. Se na Assembleia ele tem praticamente a garantia de que vai vencer, porque arriscar o nome em outro escrutínio com risco de derrota… 
 
Nessas esferas em que a derrota é mais certa, o partido acaba se comportando de maneira mais pragmática e estratégica.
 
MidiaNews – Pensando futuramente, se o PT continuar caminhando dessa forma em Mato Grosso, acredita que perderá cada vez mais representatividade no Estado?
 
Thiago Cury – Acredito que sim. São movimentos muito comuns da política que de tempos em tempos se rearranja.  Então, a gente teve num dado momento, o PSDB sendo um partido hegemônico. O PMDB, que hoje é identificado como MDB, sendo outro também muito hegemônico e isso vai mudando porque o jogo político e também a sociedade absorve novos parâmetros, novas demandas. 
 
Acredito que do ponto de vista nacional, o PT sempre vai ser um partido muito forte, porque tem uma base de afiliados que é muito consistente. Agora, é claro que isto vai variar de um local para outro. Da mesma maneira que há um recuo em estados que são mais identificados como conservadores, continua muito forte e até ampliou a sua influência em regiões que são culturalmente mais progressistas. 
 
Acho que nesse sentido, a tendência é que o PT de fato, pensando em um cenário aqui mato-grossense, é que se comporte nas eleições para governador e prefeituras se coloque mais como apoiador de outra candidatura, porque é melhor você ter um aliado eleito do que ter uma candidatura própria que não vai ganhar.
 
MidiaNews – Acha que o desempenho tido como negativo do presidente Lula também atrapalha a projeção de nomes do PT e da esquerda de um modo geral?
 
Thiago Cury – É claro. Uma figura muito proeminente como o Lula, sendo presidente da República, atual e ainda com outros dois mandatos no seu histórico, quanto melhor ele tiver aprovado, com maior eficiência, vai conseguir replicar esse capital político para candidaturas mais regionais.  E evidentemente que o oposto é verdade.
 
Se ele tem dificuldades na  popularidade é como se a indicação dele absorvesse também esta rejeição. O momento atual, ele é importante porque é uma fotografia, mas  não é um vídeo. Ou seja aquilo que vai definir a competitividade maior ou menor dos candidatos na campanha eleitoral do ano que vem, vai ser definido mais próximo do início da campanha. 
 
Em um caso muito semelhante ao que aconteceu com o ex-presidente Jair Bolsonaro, que chegou a ter 19% de aprovação, o Lula agora está inclusive com 27%, mas um ano depois [Bolsonaro] se apresentou como um candidato muito competitivo, perdendo a eleição ali por dois pontos percentuais.
 
Hoje, o cenário é este, de reprovação do presidente da República alta, mas tudo isso pode mudar para melhor ou para pior à medida que a campanha eleitoral se aproximar.
 
MidiaNews – Para o PT, o melhor cenário será tentar uma reeleição do Lula? Ou uma eventual derrota pode ficar ruim para ele encerrar a carreira?
 
Thiago Cury – A melhor chance, talvez até a única, do PT vencer a eleição seja com Lula.  Apresentar outra candidatura, é praticamente definitiva no sentido de que haverá uma derrota, porque não haverá tempo desta nova plataforma política se enraizar no colégio eleitoral brasileiro a ponto de poder vencer a eleição. 
 
Mas tem um lado positivo, o lado positivo é que esta nova figura política, se candidatando agora, pode de alguma maneira semear alguma coisa para quatro anos depois. O que é super razoável não só na política, em qualquer área da nossa sociedade. 
 
Quando você apresenta uma novidade, essa novidade pode ter um efeito positivo. Porém, sendo mais de um espectro da esquerda, a novidade seria mais olhando para o próximo ciclo, aceitando que este aqui está perdido e já se colocando para as eleições de 2030. 
 
O que acredito que vai acontecer é que se as coisas continuarem como estão neste cenário, a tendência é que o Lula seja candidato à reeleição e aí então esta alternativa para o PT, para o campo da esquerda, viria só depois. 
 
Agora, se por qualquer motivo o Lula não vier a ser o candidato, o PT vai ter que criar em um curto espaço de tempo uma plataforma para que um nome seja minimamente viável daqui a um ano e meio. Acho difícil, acho bem improvável uma candidatura nova do PT ser vitoriosa.
 



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