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“Não defendo imposto sobre desgraça alheia e destruição de lar”

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No momento em que o país discute a regulamentação das apostas e dos jogos online, o secretário estadual de Fazenda de Mato Grosso, Rogério Gallo, se posiciona contra qualquer incentivo à atividade, a despeito da possibilidade de se elevar a arrecadação de impostos.

 

“Eu, sinceramente, não defendo imposto sobre a desgraça alheia, sobre a destruição de lares, de vidas, a desestruturação completa de famílias. Isso está ocorrendo e todos já começamos a perceber”, afirmou nesta semana em entrevista ao MidiaNews.

 

Eu, sinceramente, não defendo imposto sobre a desgraça alheia, sobre a destruição de lares, de vidas

Gallo defende um “freio de arrumação” com “forte regulamentação” no setor, que nos primeiros meses do ano movimentou R$ 160 bilhões no País.

 

Na entrevista, o secretário ainda falou da expectativa com a safra, do futuro econômico de Mato Grosso, das mazelas da Reforma Tributária e até de suas pretensões para 2026.

 

“Estou focado na minha agenda do dia a dia, que não é simples, não é fácil. Imagina ainda conviver com discussões sobre se vai ser ou não vai ser ou não candidato”, disse.

 

 

Confira os principais trechos da entrevista:

 

MidiaNews – No final do ano passado e começo deste ano havia um grande temor quanto à arrecadação por causa da seca. Como tem se comportado a receita estadual em 2024?

 

Rogério Gallo – Tivemos um primeiro semestre muito desafiador em relação a arrecadação do ICMS, que é o nosso principal tributo, responsável por, em torno, de 60% de todo o Estado. 

 

No primeiro semestre, em função da seca que abateu as nossas plantações, sobretudo no Médio-Norte, tivemos, sim, uma queda e com isso se colheu menos. Além disso, teve uma queda nos preços de commodities como soja e milho.

 

A gente vê no segundo semestre, e inicio do ano que vem, uma recuperação da arrecadação dos impactos

Tivemos uma acomodação da arrecadação, paramos de crescer no ritmo que vínhamos crescendo. E no segundo semestre vimos uma recuperação. Isso se deve, claramente, aos nossos produtores rurais. Eles são sempre muito otimistas, apostam e arriscam. Esperamos que venha uma supersafra novamente.

 

Portanto, a gente vê que nesse segundo semestre, e inicio do ano que vem, uma recuperação da arrecadação dos impactos no primeiro semestre com um aumento de 6% a 7% da arrecadação.

 

MidiaNews – Com esse temor que se criou sobre o agro, não levanta um sinal vermelho para Mato Grosso acelerar a diversificação da economia? 

 

Rogério Gallo – A gente vem acelerando desde 2019. O nosso programa de desenvolvimento industrial é associado ao ICMS, em que a gente concede um benefício fiscal de redução do imposto (ICMS) para as indústrias se instalarem aqui. Somos supercompetitivos. A gente recebe, obviamente, concorrência de estados vizinhos como Mato Grosso do Sul e Goiás, porque são estados que têm a mesma vocação que a nossa, pois são grandes produtores agrícolas. 

 

Eles competem nas usinas de esmagamento de soja, de etanol de milho, em frigoríficos. Então temos que manter o nosso pacote de benefícios fiscais atraente para que as empresas, as indústrias continuem se instalando aqui. 

 

Eu diria que Mato Grosso se comportou muito bem nessa questão da diversificação e também da verticalização da economia. Quer dizer, é produzir o grão, ele ser transformado em óleo, em etanol, e isso agrega valor ao Estado.

  

O Estado se encontra mais presente onde precisa de infraestrutura: estradas e pontes. Os produtores rurais também precisam ser competitivos, conseguir manter a produção para que a gente tenha matéria-prima suficiente para abastecer essas indústrias. Hoje, em torno de 35% a 40% do milho produzido em Mato Grosso está sendo esmagado aqui. Se comparar com dados de 6 ou 7 anos atrás, o milho saía praticamente todo para exportação.

 

Com isso, estamos gerando riquezas para o Estado, gerando empregos e empregos de maior qualidade. Mas é sempre um desafio. Agora, temos que partir para o algodão, por exemplo. 

 

MidiaNews – Como?

 

Somos o maior produtor de algodão do Brasil. Nosso desafio é produzir tecido e confecções. Ao invés dessa pluma sair daqui e ir para Fortaleza ou Blumenau, que a gente consiga processar aqui

Rogério Gallo – Nós já temos algumas empresas se instalando aqui. Somos o maior produtor de algodão. Setenta por cento da pluma do algodão produzida no Brasil é de Mato Grosso e nosso desafio é produzir tecidos e confecções. Ao invés dessa pluma sair daqui e ir para Fortaleza (CE) ou Blumenau (SC), que a gente consiga processar aqui.

 

Esse é o nosso desafio e a gente está conseguindo. Em Campo Verde temos algumas indústrias de fiação, que é o primeiro passo. Ou seja, estamos no início de um estágio promissor, de geração de emprego no setor do algodão. 

  

MidiaNews – O governador Mauro Mendes já citou a produção de café em algumas entrevistas, disse que podemos nos tornar o maior produtor nacional.

 

Rogério Gallo – Estamos conseguindo resolver a logística do Noroeste do Estado, também com a construção sobre o Rio Juruena, da maior ponte de Mato Grosso com 1.300 metros, que vai ligar toda aquela região com a BR-163 e com escoamento tanto para o sul do País como para o norte. 

 

Ali, somos muito competitivos com o Café Conilon, em que o maior produtor nacional é o estado de Espírito Santo. E não se assustem se daqui uns 4 ou 5 anos com todo o investimento que estamos fazendo, nos tornamos o maior produtor nacional de Conilon.

 

A gente tem muito o que fazer nessa área, mas são setores que agregam muito valor. Um hectare de café produz e consegue gerar de riqueza muito mais do que se gera em um hectare de milho. 

 

É nisso que a gente está trabalhando: para gerar valor para o pequeno produtor rural. Não pode deixar ninguém para trás no estado. O nosso agro é competitivo nas commodities, mas estamos olhando muito fortemente também para a cadeia dos pequenos produtores rurais.

 

MidiaNews – As bets e os jogos online estão no centro de uma polemica no Brasil. Por um lado podem elevar a arrecadação de impostos, mas por outro causar problemas de dependência. Sendo um secretário de Fazenda – portanto afeito ao assunto arrecadação -, como o senhor enxerga esse momento?

 

Rogério Gallo – Eu, sinceramente, não defendo imposto sobre a desgraça alheia, a destruição de lares, de vidas, a desestruturação completa de famílias. Isso está ocorrendo e todos já começamos a perceber. Isso é mais ou menos como funciona com vício em uma dependência química. Conheço gente já com vícios em apostas também. Bingo, poker… 

 

O que antes dependia da pessoa, eventualmente, se reunir para jogar um baralho, por exemplo, em um ou dois dias na semana, agora está na palma da mão.

 

Victor Ostetti/MidiaNews

Rogério Gallo

Gallo: “Eu sou absolutamente contra a tributação de Bets, porque ao final do dia, você está tributando a desgraça e a destruição de pessoas”

O cara aposta se vai ter um escanteio do lado esquerdo aos 47 do segundo tempo. Não tem nada de racional, estatístico, nem lógico nisso. Eu sou absolutamente contra a tributação de bets, porque ao final do dia você está tributando a desgraça e a destruição de pessoas e de famílias.

 

O caminho, nesse aspecto, sou radical, é uma forte regulamentação. Não faz sentido o modo como o Brasil está fazendo. Uma coisa é você apostar no resultado, a outra é você fazer a aposta do modo como está sendo feito hoje. Em uma partida de futebol, você tem 100 oportunidades de aposta. Isso que é um vício e que permite inclusive fraudes. Não fica mais no acaso.

 

MidiaNews – Mas precisa ser regulamentado né?

 

Rogério Gallo – Cabe até manipulação. Isso precisa ser regulamentado e neste momento seria de fato termos um freio de arrumação.

 

Está nas mãos do Supremo Tribunal Federal. Audiência pública aconteceu e o ministro relator Luiz Fux disse que medidas urgentes devem ser adotadas. Eu iria além, é preciso de um freio de arrumação e rediscutir absolutamente tudo. Não é razoável o que está acontecendo em relação às bets no nosso país. 

 

A pessoa utilizar 30% de tudo que é pago de Bolsa Família em bet? O recurso do Bolsa Família é para a subsistência. É para a pessoa que não consegue o mínimo para se manter vivo, para necessidades básicas. E quando 30% disso está indo para a bet, significa que algo de muito errado ocorreu na regulamentação. 

 

MidiaNews – Então, não é contrário a regulamentação, mas favorável a rigidez?

 

Rogério Gallo – A rigidez. As apostas, os jogos, infelizmente, permeiam a sociedade. Agora, é preciso regulamentar de verdade. Do modo como foi feito parece que a regulamentação foi um liberou geral e isso não é razoável. Hoje já tem uma opinião pública muito consolidada contrária ao que está acontecendo em relação às bets.

 

MidiaNews – A Sefaz tem alguma sugestão sobre quanto isso está impactando na economia de Mato Grosso?

 

Rogério Gallo – A bet é tributada só pelo Governo Federal. Vamos colocar que vem R$ 1 bilhão para Mato Grosso, por ano, do Bolsa Família. Mas 30% disso não é consumido no mercado. Isso atinge não o governo, mas o mercadinho, a farmácia, a casa de frutas… As pessoas gastam o dinheiro do Bolsa Família, e já há estudos sobre isso, em um raio de até 500 metros perto da casa dela. 

 

Esse recurso impacta a economia. Imagina no Norte, no Nordeste, e aqui em Mato Grosso, em que temos cidades que são movimentadas pelos recursos do Bolsa Família e salários dos servidores públicos… Então, impacta sim, impacta o comércio local.

 

Consolida-se isso na mão de poucas pessoas. Falo de 150 ou 200 bets que pertencem a poucos grupos econômicos. Não acho que isso é socialmente saudável. 

  

Victor Ostetti/MidiaNews

Rogério Gallo

Rogério Gallo: “Bets impactam, sim, no comércio local”

MidiaNews – Mato Grosso está atravessando um período razoavelmente longo de prosperidade. Como enxerga o Estado nas próximas décadas? Temos condições de ser uma potência econômica no País? 

 

Rogério Gallo – Somos uma potência econômica na perspectiva da produção de commodities, no agronegócio. É perceptível que a economia privada vem fazendo em Mato Grosso o seu papel muito bem feito, há muitos anos, de modo consistente. Se você pegar os números do PIB são impressionantes o crescimento nos últimos 25 anos, quando de uma forma mais organizada o Estado passou a apoiar com programas de desenvolvimento rural, industrial, comercial… É extraordinário que a gente cresceu. O nosso PIB cresceu algumas vezes a mais do que a média nacional. 

 

Agora, o que temos que cuidar é da economia pública. São duas grandes dimensões que formam a economia: o setor privado, que tem que ser pujante, e ter liberdade para atuar; e o setor público, que tem que estar junto, porque existem investimentos que são naturalmente, e devem ser, providos pelo setor público. O principal deles é a infraestrutura, como estradas e pontes. Temos feito fortemente isso no estado, são 6 mil quilômetros nos últimos seis anos. E para o Estado fazer esses investimentos, é preciso ter equilíbrio fiscal.

  

Vamos terminar a gestão Mendes com 12.500 km de estradas pavimentadas, estou dizendo também que ainda faltam 20 mil km para pavimentar. O nosso desafio é enorme.

 

Então, o setor privado já faz o seu papel e na administração pública temos que ser referência, com gestão fiscal eficiente e responsável. É manter, ao longo dos anos, a trajetória de sustentação de manutenção de no mínimo 15% do orçamento público em investimento.

 

MidiaNews – O governador Mauro Mendes em algumas entrevistas fala em 19% a 20% em investimentos este ano. Vocês apresentaram a LOA de 2025 na Assembleia Legislativa, com orçamento R$ 37 bilhões de orçamento. Vai manter esse nível de investimento para o ano que vem?

 

Rogério Gallo – Quando menciono 15%, é a meta inicial. O orçamento é montado com no mínimo 15% de investimentos. E você está correta, a gente terminou o ano passado com 19%, quase 20%, e esse ano a nossa meta é continuar na casa de 20%, mas nunca cair para menos de 15% do orçamento. 

 

Para se ter uma ideia, o Governo Federal investe menos de 2% e é um investimento completamente pulverizado, granularizado, que é feito por meio de emendas parlamentares, que não são investimentos estruturais, como estradas, pontes, hospitais, que demandam investimentos mais robustos. 

 

De fato, estamos assegurados no orçamento do ano que vem investimentos entre 15% a 20%. Só psra tangibilizar: são R$ 6 bilhões do orçamento que investimos ao longo dos últimos quatro anos, que foi quando o Estado se recuperou. 

 

Lembrando, no início, a gente devia pra 11 mil fornecedores do Estado, um Estado que tinha uma dívida de R$ 4 bilhões, parcelava salários e foi feito dever de casa, tomamos as medidas de contenção do gasto público, de correção dos privilégios fiscais, tributários e voltamos a gastar com qualidade.

 

 

MidiaNews – O senhor citou a recuperação fiscal do Estado. Mato Grosso já chegou a ter nota C, no Tesouro nacional no quesito Capacidade de Pagamento (Capag). Como está a Capag hoje?

 

Rogério Gallo – A Secretaria de Tesouro Nacional classifica os estados e municípios da nota máxima, que é A, até a nota mínima, que é D. As duas piores notas são C e D. Sendo D aquele estado que está quebrado. Como o Estado não decreta falência, tem que ir para uma recuperação, que se chama recuperação fiscal, isso é a letra D.

 

A letra C é aquele Estado que está flertando com a quebradeira, que era o nosso caso em 2019, quando a gente começou o trabalho de recuperação do Estado. E conseguimos, em 2021, sair da nota C e atingir a nota A. 

 

Em 2021, 2022, 2023 e 2024, Mato Grosso mantém a sua capacidade de pagamento A, que é a máxima. Além disso, hoje, temos o mérito de termos uma gestão fiscal que briga com o Espirito Santo. 

 

Hoje, a pessoa que quer trabalhar e tem aptidão para a vaga que está aberta, ela está empregada no mesmo dia

No ano passado, estivemos em primeiro lugar, esse ano o Espírito Santo nos ultrapassou, somos o segundo colocado em gestão fiscal e isso nos assegura um espaço para fazer investimento maior do que outros estados da federação. E coloca Mato Grosso praticamente livre do desemprego. Hoje, a pessoa que quer trabalhar e tem aptidão para a vaga que está aberta, ela está empregada no mesmo dia. A taxa de desemprego está em 2,5% a 3%. Nós estamos praticamente no pleno emprego. 

 

MidiaNews – E sobre a distribuição de renda. A gente vive o Pleno Emprego, mas quase 30% da população de Mato Grosso no CadÚnico. Como o Estado pode atuar para que essas pessoas tenham melhor qualidade de vida?

 

Rogério Gallo – Os empregos que estão sendo gerados no Estado são de qualidade. Os empregos disponíveis no Sine, sobretudo para o setor industrial, de serviços, de construção, os salários são ótimos, são compatíveis e diria até acima da média nacional. Agora, temos um problema estrutural, que não é do Estado, mas do país, em que temos uma parcela da população, infelizmente, que está numa condição de desalento, que precisa de apoio, e de assistência. 

 

Nisso temos os programas estaduais, do Ser Família, como dizia a primeira-dama Virginia Mendes, e isso coloca recursos para  pessoas que precisam de provimento do mínimo existencial. 

 

Agora, o outro aspecto é um paradoxo:  estamos num Estado de pleno emprego e  temos pessoas desempregadas. Por quê? Há uma desconexão entre a oferta do emprego, as vocações que estão sendo demandadas, e o que as pessoas tem de capacidade instalada de executar tarefas. 

 

Nós temos que capacitar e formar pessoas. E esse é o desafio, não de Mato Grosso, mas do País. E isso também passa um pouco sobre a cultura do bacharelado no Brasil.

 

MidiaNews – Cultura do bacharelado?

 

Rogerio Gallo – É uma coisa que eu tenho avaliado, lido bastante a respeito. A gente forma muitos bacharéis. A universidade tem um mito no Brasil que vai, necessariamente, gerar sempre as melhores oportunidades. E a gente sabe que no Brasil 80% ou 85% das formações, são pelas universidades em bacharelados que está subempregada. Eu poderia citar dezenas de pessoas que tiveram uma formação na universidade e estão trabalhando em outra área.

 

MidiaNews – O senhor é um entusiasta dos Institutos Federais?

 

Victor Ostetti/MidiaNews

Rogério Gallo

Rogério Gallo: “Aqui no País há um sentimento de que é menor se formar para uma atividade técnica. E isso é um grande equívoco”

Rogério Gallo – Da formação técnica. Quando você pega os paralelos em outros países, metade da formação é técnica e metade da formação é o bacharelado. Aqui no País, há um sentimento de que é formação menor se formar numa escola técnica, para uma atividade técnica. E isso é um grande equívoco, porque a produtividade se complementa entre formação universitária com formação técnica. 

 

Hoje uma operadora de máquina agrícola ganha na casa de R$ 10 ou 12 mil. E para você ter uma formação universitária, um recém-formado, ganhando esses valores é muito raro. A gente tem que desmistificar isso. A formação técnica oferece excelentes oportunidades.

 

MidiaNews – Nas últimas semanas, o Governo Lula tem discutido um pacote de corte de gastos. Entre eles, está a remodelamento de programas sociais. Vê como primordial essas mudanças? 

 

Rogério Gallo – A gente precisa ter qualidade do gasto público. Às vezes, usam uma expressão: “gasto é vida”. Gasto tem que servir a um propósito muito bem planejado, porque senão é simplesmente desperdício. É preciso tomar muito cuidado com a diferença entre gasto e desperdício.

 

Eu sou um defensor de que haja sempre reavaliação dos gastos públicos para verificar se eles estão gerando valor para a sociedade. Esse é um ponto: não é que se deve fazer uma revisão este ano e esse debate todo que está acontecendo no país. Isso deve ser da nossa cultura.

 

Nos Estados Unidos, há um processo de discussão orçamentária muito democrática. As pessoas se envolvem no debate do orçamento e se as propostas não forem boas, elas são rejeitadas. É preciso provar que aquilo que você vai fazer com recurso público vai gerar valor positivo para a sociedade.

 

O que eu vejo é que começou tarde. Esse debate de gastos que tinha que ter sido feito lá atrás junto com o arcabouço fiscal, que se sustenteu apenas no pilar do aumento da receita pública, num país que já tributa 33% do PIB. Nós pagamos muito imposto. Não tem muito espaço para fazer uma correção, para alcançar o equilíbrio fiscal. Quer dizer, tem que qualificar o gasto público.

 

Chegou tarde, o debate está um pouco… Não por culpa do ministro Haddad, mas pela área política. Nunca é fácil cortar gasto público. Os gastos públicos no país também tiveram uma apropriação pelo Parlamento ao longo dos últimos cinco ou seis anos com as emendas parlamentares.

 

 

MidiaNews – Nós tivemos discussões profundas sobre a reforma tributária, que ainda está em debate. Qual o balanço faz sobre essas mudanças na ótica de Mato Grosso?

 

Rogério Gallo – A reforma atinge Mato Grosso no coração. Temos uma população pequena, somos muito produtivos. Somos um estado com uma vocação de ter uma balança comercial superavitária, quer dizer, a gente produz mais do que consome. A gente importa menos produtos do que exportando. 

 

Então, dependemos das nossas vendas para outros estados. E o ICMS tributa essas vendas e um pedacinho desse imposto, que é recolhido por quem consome os produtos de Mato Grosso, fica para o estado. A reforma destrói isso.

 

O ICMS desaparece em 2032, nasce o imposto sobre bens e serviço, que vai ser tributado exclusivamente onde o produto é consumido. Quer dizer, não vamos ficar com nenhuma parte do etanol, do óleo, e vamos ter que sustentar todas as despesas públicas do Estado e os seus investimentos com aquele imposto que é gerado pelo nosso consumo.

 

MidiaNews – Qual o primeiro diagnóstico?

 

Victor Ostetti/MidiaNews

Rogério Gallo

Primeiro impacto da reforma tributária será uma queda de arrecadação muito relevante, diz Sefaz

Rogério Gallo – Vamos ter uma queda de arrecadação, e uma queda muito relevante. A gente diminui a trajetória de crescimento para passar a ter um decréscimo de arrecadação com esse novo tributo. Isso é uma inversão de lógica. A gente tem que se reinventar do ponto de vista de financiamento do Estado. 

 

Hoje, temos o ICMS e o Fethab como os dois grandes provedores de receita. Estamos falando de R$ 26 bilhões, de um orçamento de R$ 36 bilhões. Quase 70% do orçamento do Estado é Fethab e ICMS, riquezas geradas aqui dentro do Estado.

 

Quando o Fethab desaparece, e vai desaparecer em 2043, e desaparece o ICMS, a gente tem que se preparar para isso.

 

E ainda tem outro aspecto que é o da competitividade. Mato Grosso está longe dos portos. Damos incentivo fiscal para compensar essa logística, e isso vai desaparecer. Se desaparecer o ICMS, não tem mais programa de desenvolvimento. O que vai entrar no lugar? Um tal de fundo nacional de desenvolvimento regional. 

 

A União vai colocar R$ 40 bilhões por ano e esses recursos vão ser distribuídos para os estados fazerem subsídio para as empresas. Ok. Aí não será mais um benefício pelo imposto, mas um benefício pelo caixa do Estado, com dinheiro federal. Como que vai ser distribuído? O Centro-Oeste foi severamente penalizado nessa distribuição. Eu até diria que é uma medida inconstitucional.

  

Mato Grosso tem a segunda maior renda per capita do Brasil. Isso significa dizer que no FPE recebemos muito pouco do repasse federal. E, 70% desse R$ 40 bilhões vão ser distribuídos por esse critério.

 

E os outros 30% desses R$ 40 bilhões vão ser distribuídos de acordo com a população, em que a nossa é pequena, com cerca de 1,5% da população nacional. 

 

 

MidiaNews – E a projeção é…?

 

Rogério Gallo – Desses R$ 40 bilhões, estamos projetando receber cerca de R$ 1 bilhão. É muito pouco. Hoje, só no nosso programa de desenvolvimento industrial, nós apoiamos as empresas com R$ 5 bilhões.

 

Midianews – O senhor citou a palavra inconstitucionalidade…

 

Rogério Gallo – É que se coloca quem está em situação igual e trata de modo diferente, ou quem está em situações diferentes trata desigualmente, mas favorecendo àquele em uma posição melhor.

 

Vou te dar um exemplo: Acre e Mato Grosso. Não faz sentido a gente receber menos do que o Acre. Quer dizer, tínhamos que estar recebendo pelo menos igual ou mais. E não faz sentido também do outro lado, de quem é desigual, como Mato Grosso e São Paulo, o São Paulo recebe três vezes mais que Mato Grosso. É disso que se trata. 

 

A gente entende que há uma quebra do princípio que promove a redução das desigualdades regionais, porque o dinheiro público federal vai entrar e não vai conseguir promover a eliminação das desigualdades. Porque com esse recurso, São Paulo pode se desenvolver mais, num ritmo maior do que aquele que Mato Grosso vai se desenvolver com recursos federais.

 

MidiaNews – Há possibilidade de se corrigir com uma emenda. 

 

Victor Ostetti/MidiaNews

Rogério Gallo

O secretário de Fazenda Rogério Gallo, crê que distorções da Reforma Tributária podem ser corrigidas com proposta de emenda à Constituição no Congresso Nacional

Rogério Gallo – É possível corrigir de duas formas. Pode-se levar ao Supremo no Tribunal Federal com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, mas não sei se esse caminho é muito viável, e é muito incerto. Mas tem o caminho político, que acredito muito.

 

A proposta do Mato Grosso e Mato Grosso Sul, e de estados que também são perdedores nesse fundo de desenvolvimento regional, é: não tem problema ter o FPE e nem a questão da população, o problema é você não ter um indicador que pegue a nossa realidade.

 

E colocamos que poderia ser 60% do fundo distribuído de acordo com o critério do Fundo de Participação dos Estados. Atenderia ao país e as diferentes realidades. O problema é que os dois critérios que foram colocados não atende as diferentes realidades socioeconômicas do país. 

 

A gente vai fazer esse debate, liderado pelo governador Mauro Mendes, o vice Otaviano Pivetta, e a bancada federal de Mato Grosso. Fazer uma proposta de emenda constitucional para alterar o dispositivo que foi colocado pela Emenda Constitucional 132 que estabeleceu esses dois critérios.

 

A gente não quer tirar dinheiro de ninguém. O que a gente quer é ser mais justo na distribuição desse recurso que é de todos os brasileiros.

 

 

  

MidiaNews – A viu um crescimento do PL e da extrema direita muito grande nas últimas eleições, especialmente em Mato Grosso. O senhor não teme que o avanço dessa sigla possa atrapalhar os planos do vice-governador Otaviano Pivetta em se candidatar ao Governo em 2026?

 

Rogério Gallo – Eu não acredito. Estivemos juntos com o PL em 2022. Não acredito que estejamos distantes em 2026. Acho que tem muita coisa para acontecer. O PL ganhou prefeituras muito importantes: Cuiabá, Várzea Grande, Rondonópolis e Primavera do Leste. E me parece que há uma sintonia nas agendas. Acredito muito que devamos caminhar juntos, mas é muito hábito passar embaixo dessa ponte.

 

MidiaNews – E sobre a sua pretensão política eleitoral. O senhor é um dos braços direitos do governador, um homem de confiança, nesse cenário, admite ser candidato a algum cargo eletivo em 2026? 

 

Rogério Gallo – Nunca trabalho com essas hipóteses de planejamento de futuro em relação a essas questões. Para ser muito pragmático, estou muito focado na Secretaria. A gente tem desafios enormes, como essa transição do ICMS, para esse novo tributo do IBS, com as perdas que Mato Grosso vai ter na perspectiva do financiamento público.

 

Estou muito focado e não penso nisso neste momento. E não creio que seja uma agenda saudável para ser colocada. É um dia de cada vez e trabalho muito para continuar contribuindo com o Estado. 

 

Sou servidor público há 22 anos, sou procurador do Estado, apaixonado por aquilo que faço e vou continuar contribuindo com o setor público onde eu estiver. Mas, hoje, não afirmaria que é um projeto para 2026. Estou focado na minha agenda do dia a dia que não é simples, não é fácil. Imagina ainda conviver com discussões sobre se vai ser ou não vai ser ou não candidato. Isso não está no meu radar. 

 

Veja entrevista completa:

 

 

 





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