A maranhense Valquíria Pinheiro Miranda, de 40 anos, conhecida como “Val”, mudou-se há mais de duas décadas para Cuiabá atrás de oportunidades em terras mato-grossenses.
Tem dias que eu trabalho por 8 horas, tem dias 10 e tem dias que eu faço até 12
Motorista de aplicativo, hoje em dia ela passa grande parte do dia circulando pelas ruas da Capital dirigindo um Fiat Uno e transportando dezenas de passageiros. Mas Val não é uma motorista comum. Além levar e trazer pessoas, ela transforma a conversa com elas na matéria-prima de seu podcast.
Val começou a trabalhar de motorista de aplicativo após sofrer um baque financeiro e perder suas economias em um negócio que deu errado. Ela já havia trabalhado dirigindo entre 2018 e 2019, mas apenas para complementar a renda.
A partir de 2022, após quase perder tudo, retornou para as corridas, agora dependendo delas para se sustentar.
“Depois de ir ao fundo do poço, quando eu perdi todo meu patrimônio, hoje a minha renda é 100% originada do aplicativo. Tem dias que eu trabalho por 8 horas, tem dias 10 e tem dias que eu faço até 12, que é o limite máximo que a empresa permite”, disse durante uma viagem com a reportagem do MidaNews.
O PodVal
Alguém que conversa fácil e logo cativa o interlocutor, Val ouvia diversos relatos de seus passageiros durante as viagens. Ela diz que se sente bem podendo ouvir e ajudar com alguma palavra o passageiro, assim como muitos saem do carro se sentindo melhor em ter desabafado para alguém que os ouça. Daí veio a ideia do formato de podcast.
Victor Ostetti/MidiaNews
Valquíria retornou a fazer corridas em 2022 e hoje sua renda depende delas
“De acordo com os diálogos, com as conversas, eu vi o quanto as pessoas têm necessidade de alguém ouvi-las, de alguém parar um pouquinho para observar o que está passando, o que está vivenciando. Foi aí que surgiu a ideia. O PodVal me ensina todo santo dia uma coisa nova, uma coisa diferente”.
Quanto ao formato, Val explica que quando o passageiro entra, a conversa flui naturalmente. “Bom dia, tudo bem? Como é que está? Com o que trabalha?”, perguntas comuns de inicío de qualquer diálogo, até que a conversa começa a se desenvolver.
Depois, ela pergunta: “Você já viu falar em podcast no Uber?”. Da maioria das pessoas a resposta ouvida é um “não”.
Val explica e caso a pessoa aceite ser gravada, ela posiciona o celular no suporte e começa o vídeo. A temática pode ser sobre tudo.
“Às vezes tem um assunto específico: ‘Ah vamos falar aí sobre trânsito, vamos falar sobre política’. Mas quando não tem um, a gente começa a conversar naturalmente. ‘Ah, mas eu tenho vergonha’. Digo relaxa e vamos conversando. É surreal como flui, é uma coisa muito leve, muito dinâmica, muito extrovertida”.
Publicitária de formação, Val ainda não tem renda extra com o podcast. Hoje a ação é apenas um hobby que a deixa mais feliz e a aproxima de seus passageiros, que segundo ela acabam tendo uma confiança para anotar seu número e combinar corridas privadas.
“Por enquanto é como um hobby. Eu gosto e me sinto bem demais fazendo. No dia em que não faço, parece que tá faltando alguma coisa”.
Ela sonha em trabalhar um dia na área da publicidade, na qual nunca atuou. Caso isso aconteça, mesmo assim não quer deixar de produzir os episódios de seu PodVal.
Relatos
Entre as dezenas de relatos que já ouviu e que renderam, bons episódios de seu podcast, ela se recordou da história de Marcela, uma mulher do interior que teve de se mudar para a Capital após descobrir que enfrentava problemas renais e teria de fazer hemodiálise 3 vezes na semana.
Por enquanto é como um hobby. […] dia que eu não faço parece que tá faltando alguma coisa
“Histórias como a dela me fazem virar a chave da minha vida e pensar qual é o meu problema diante de uma mulher dessas? Então eu falei: ‘Que problema eu tenho?’. E além da história dela, tem muitas outras emocionantes”.
Val relata também que já enfrentou momentos de medo na profissão, como a maioria dos motoristas de aplicativo já enfrentou, quando a questão é segurança. Ela nunca foi assaltada ou sofreu alguma violência, mas já aceitou passageiros cujo destino eram lugares perigosos, além de atitudes suspeitas.
“Eu falei: ‘Meu Deus do céu, Senhor, me protege, Senhor, me tira dessa, você sabe que eu tô aqui porque preciso’. Quando eles [passageiros] saíram, eu sei que andei uns 100 metros, e chorei igual uma criança”, relata.
Victor Ostetti/MidiaNews
Val fica até 12h por dia fazendo viagens e grava episódios com alguns passageiros
Ao reportar uma das situações, ela conta que não recebeu suporte nenhum da empresa. Depois disso, deixou de fazer corridas por essa plataforma e só utiliza a concorrente.
A motorista diz que se pudesse trabalharia mais durante à noite, porque não tem trânsito e não tem calor. O problema é a segurança, diz.
Às vezes também ela se depara com um passageiro de mau humor ou que não quer conversar.
“Eu não tenho relato de pessoas arrogantes, estúpidas, ignorantes, vez ou outra tem aquele passageiro que bate a porta [com raiva], né? Mas na hora penso que a pessoa às vezes está passando por uma situação difícil”.
Felizmente na maioria das vezes, dá certo. A viagem é tranquila, a conversa flui e o conteúdo feito por ela vai direto para as plataformas Instagram, Youtube e Tiktok, onde mantém perfis e os atualiza com os vídeos das conversas.
Quem se interessou, pode conferir alguns de seus vídeos abaixo e acompanhar as redes sociais do PodVal.
Veja: